"Suite Isabelle", Jacques Calone Quando me sinto bem disposto, seja em carruagem quando viajo, seja à noite quando durmo, acodem-me as ideias aos jorros, soberbamente. Como e donde, naõ sei.
As que me agradam guardo-as como se me tivessem sido trazidas por outras pessoas, retenho-as na memória e, uma após outra, delas tomo a parte necessária para fazer um pastel segundo as regras do contraponto, da harmonia, dos instrumentos, etc.
Então, quando estou em profundo sossego, sinto aquilo crescer, crescer para a claridade de tal forma que a obra mesmo extensa se completa na minha cabeça e posso abrangê-la de um só relance, como um belo retrato ou uma bela mulher, e isso não parte por parte, mas de uma só vez. Achar aquilo e realizá-lo é um sonho soberbo que se desenvolve dentro de mim.
Quando chego a esse ponto, nada mais esqueço, porque a memória é o melhor dom que Deus me deu.
Mozart
in "Pública"
Janeiro 2006