Há dois anos caí de para-quedas no festival Andanças em S.Pedro do Sul, de danças de todo o mundo.Entre dias descalços e noites de música, as danças que mais me tiraram o sono foram as tradicionais europeias. Mais tarde, já em Lisboa, decidi ter aulas, ao mesmo tempo que descobri existirem pequenos encontros destas danças quase quinzenalmente na capital, em teatros ou na rua. E começou o fascínio.
Entre saias que rodam e olhares que se cruzam desprevenidamente, aos poucos fui descobrindo a simplicidade com que nos podemos entregar ao que não conhecemos. Aos poucos fui descobrindo a alegria de uma
chappeloise e o êxtase de um
círculo, danças que nos fazem trocar de par e oferecer o que não somos a quem nos vê pela primeira vez
. E segunda, e terceira e quarta. Aos poucos fui descobrindo o desenrascar em gargalhadas de uma
scotish, dança de pares que nunca trocam. Aos poucos fui descobrindo, o jogo de sedução que é uma
burrée, onde sem nunca tocarmos no nosso par, o perseguimos e o fazemos perseguir-nos, com voltas e fingimentos e sorrisos. Mas sobretudo com os olhos. Quando os olhos sorriem só por si, ou fitam, ou fixam, numa
burrée nem é preciso fazermos sorrir a cara. É como se os olhos comandassem o nosso corpo, e o corpo de quem dança connosco. Somos comandados também, claro que somos e gostamos.
Porém a dança que mais prazer me deu descobrir (ou talvez desvendar) foi a
mazurka. É uma dança a pares, o homem conduz a mulher. Entre a subtileza de um "up" e a naturalidade de voltas leves, entregamos tudo por uma música e inconscientemente fazemos os olhos fechar, e acordar só no fim.
Gosto sobretudo do encanto de todas as cores em que nos transformamos
while dancing. Transformamo-nos? Acho que sim. Não. Não sei se. Afinal, pela música de Manuela Azevedo dos Clã "dançar é apenas um modo mais intenso de existir, é sentir o tempo do mundo, e deixar-se ir...".
Deixo-me ir. No fim, abro os olhos e inclino-me ligeiramente. Agradeço.
Joana Félix
in" Comtextos"